Em 2021, foi editada a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
A conhecida Lei 8.666 de 1993 permaneceu vigente, até agora, em 2023, por conta da necessidade de adaptação à nova realidade normativa.
A nova lei traz um conjunto de expectativas (algumas novas, outras nem tanto) sobre o aprimoramento do relacionamento entre estado e mercado.
As licitações se situam justamente no centro do relacionamento das esferas pública e privada.
Por consequência, elas estão também no centro de um amplo conjunto de dimensões e símbolos que formam o imaginário coletivo sobre os efeitos da revogação da Lei 8.666 e a entrada em vigor de um novo regime de licitações e contratações públicas.
Eu selecionei 3 dimensões simbólicas para apresentar rapidamente aqui.
A primeira dessas dimensões diz respeito à difusão de uma certa percepção coletiva de que a licitação brasileira precisava ser urgentemente reformada, tornando-se menos burocrática, mais flexível, célere e transparente.
Além disso, ela precisava se tornar mais racional, mais eficiente e econômica.
Essa percepção se tornou ainda mais evidente com a revelação de grandes escândalos e atos de corrupção envolvendo licitações e contratações públicas.
Essas situações consolidaram uma certa impressão de que a antiga legislação, além de incapaz de evitar tais desvios, contribuiria para um ambiente favorável para a prática desses atos danosos ao erário.
Não se pode ignorar que a mudança legislativa inaugura uma nova dimensão simbólica que, gradualmente, a partir de novas boas práticas, pode ser capaz de induzir a uma mudança comportamental mais efetiva.
Uma segunda dimensão simbólica evidencia o papel que a contratação pública assumiu na contemporaneidade. Há 30 anos, a contratação pública era um mero instrumento para a aquisição de bens e serviços para o consumo interno do aparato estatal.
Hoje, além de tudo isso, os contratos administrativos se dirigem à implementação de políticas públicas, a girar a roda da economia, a trazer benefícios aos cidadãos e a promover a distribuição de riqueza (por exemplo, por meio de subsídios cruzados entre os usuários de determinado serviço).
A OCDE indica que — por meio da contratação pública — são veiculados cerca de 20 a 25% do gasto total médio dos países em desenvolvimento. É muita coisa.
Por fim, há uma terceira dimensão simbólica relacionada ao papel construtivo da nova norma pela interpretação que será produzida por todos, mas sobretudo pelos órgãos de controle.
Espera-se que passe a se visualizar, tanto a licitação quanto o contrato administrativo, como uma “caixa de ferramentas” ao bom dispor do Administrador, e não como uma “camisa de força” que bloqueie as boas iniciativas destinadas ao aprimoramento dos certames e contratos.
Em tempos de inteligência artificial, não basta conhecer a lei.
A compreensão das entrelinhas da legislação e o conhecimento das suas dimensões simbólicas são ferramentas fundamentais para a solução dos litígios complexos entre estado e mercado.
É por isso que — no nosso escritório — nós nos debruçamos também sobre essas dimensões e simbologias. São elas que nos permitem visualizar e construir os melhores caminhos para a resolução dos problemas concretos.